Visita ao dentista

Vou chegar atrasada, mas tudo bem, quem vai ter pressa para colocar dois mini-implantes e perfurar a gengiva? Esta dentista toda hora inventa uma novidade, ainda bem que não vou precisar colocar aqueles aparelhos em circunferência, que tomam a cara toda, mas também depois de tantas inovações na área da saúde, acho que já inventaram algo melhor e que não seja motivo de chacota entre a turma. A consulta estava marcada para às 9h, mas meus péssimos hábitos noturnos não me deixaram chegar a tempo. Minha mãe fala que pareço um zumbi e ainda não consigo fazer uma coisa de cada vez, tem que ser tudo ao mesmo tempo, ligo o computador e vou ler e-mails, mas a televisão tem que estar ligada para aguardar o programa do Jô, depois de alguns minutos batendo papo no msn, minha garganta fica seca, meu estômago começa a roncar, mas é tarde, não vou comer uma hora dessas. Então levanto, vou na cozinha e me satisfaço com um copo de leite, dá para agüentar até amanhã!

Cheguei no consultório às 9h15 e, pacientemente, aguardo folheando algumas revistas de fofocas. Nossa, eu estou sozinha, vou ser a próxima, começo a sentir aquele friozinho na barrida, uma mistura de medo e ansiedade, quero que tudo acabe logo. De repente, aquela porta que desliza em trilhos se abre, sai Verônica, a funcionária multiuso, é assistente do dentista quando ele está realizando algum procedimento cirúrgico e secretária, atende os telefones, anota recados, marca consultas e...enfim, ela veio me avisar que em 15 minutos seria atendida. Poxa, o confronto com o dentista estava próximo, mas vou relaxar, já estou acostumada, já arranquei tantos dentes, dentiqueiro, será que é pior? Prefiro não pensar!

Saiu uma paciente, agora vou ser atendida, mas a voz de Verônica avisando para entrar não me intimida, já cheguei até aqui, não adianta fugir, quero ficar com minha dentição perfeita, parecendo comercial de creme dental, é, a vaidade requer alguns esforços, e que esforços... Dr. Bruno me recepciona como um velho amigo, parece que já nos conhecemos há anos, mas, na verdade, esta é a segunda vez que nos vimos pessoalmente, mas seus olhos verdes me transmitiam paz e seus dois metros de altura me passavam segurança. Ao entrar na sala fui logo tratar da parte burocrática, o pagamento, como alguém pode pagar para sofrer na cadeira de dentista? Tratamento odontológico é um investimento, espero que valha a pena. Depois de tudo acertado, ele resolveu colocar a vestimenta, entrou no banheiro do consultório para trocar seu paletó e gravata por uma blusa de manga verde, aquele tecido apropriado para cirurgia, idêntico a roupa dos personagens da série plantão médico, que passava na tv.

Verônica agora desempenha o papel de assistente e me orienta a sentar na cadeira. Começa a limpar meu rosto com álcool, poxa, esqueci de ir ao banheiro, Verônica ficou retada, depois de esterilizar tudo, ela resolve ir ao banheiro, porque não foi antes quando estava na sala de espera, coitada ela deve estar com medo, faz parte da função de Verônica e mais uma vez ela repete o processo, pega a pinça, pinça o algodão, molha o algodão no álcool e limpa cada centímetro do meu rosto. Que paciência! Sua feição é natural, transmite tranqüilidade, acho que ela quer me acalmar, mas quando ela pegou aquele lençol, porque parece um lençol de tão grande, ela cobriu todo o meu rosto até a cintura com um pano, só com uma abertura na região da boca e manda colocar um óculos para proteger os respingos, mas respingos de que? Eu indaguei, mas ela preferiu dar um belo sorriso e mostrar sua dentição perfeita, que inveja!

Verônica sabia que seu silêncio seria melhor do que eu ouvir a verdade. Ela não precisa saber de tudo que vai acontecer no procedimento cirúrgico e a anestesia que Dr. Bruno vai aplicar nela vai minimizar seu sofrimento, mas Verônica não sabia que durante o processo sua fisionomia iria mudar e fazer caras assustadoras. Sua testa franzia, contei cada franzido da testa de Verônica, tem cinco quando ela está com nojo e seis quando ela não quer olhar, mas Verônica não pode transmitir medo para não assustar o paciente e Dr Bruno sinaliza, presta atenção, coloca o sugador, isto aqui é osso e isto aqui é dente Verônica. Hammmm, ela não quer saber o que é o que, ela fica mentalizando coisas boas, chocolate, praia, o beijo do seu namorado mais tarde quando sair do consultório, que estará lhe esperando sentado na sua moto, comprada em financiamento, com muito esforço do seu árduo trabalho de motoboy, qualquer coisa que pudesse esquecer aquele jorrar de sangue e tranqüilizar a paciente.

A cirurgia que era para durar 1h foi o dobro do tempo previsto. Dr. Bruno já estava corcunda e com dores na coluna, acertou mais alguns detalhes, esta é a pior parte, tenho que colar os mini implantes minuciosamente, pois um erro tem que refazer tudo de novo. E ainda preciso atender alguns pacientes antes de encerrar para o horário do almoço. Mas que almoço, não vai dar tempo, o jeito vai ser pedir alguma comida aqui no consultório mesmo. Na parte da tarde também tem mais duas cirurgias, a de Ana Paula e Daniela, será que Verônica ligou para as meninas para confirmar? Espero que sim, pois esta já é a segunda remarcação por falta de atenção de Verônica. Hoje acho que vou comer besteira, já sei vou experimentar o sherec menu, hummmm, que delícia, deve ser muito gostoso, adoro queijo chedar... dois hamburguês, alface, queijo, molho especial, cebola e picles num pão de gergelim, nossa, aprendi a musiquinha da Mc Donalds por osmose de tanto ouvir, vou parar de assistir tv enquanto estiver atendendo aos pacientes. Até que enfim, terminei, será que Verônica também vai querer experimentar o sherec menu? Depois pergunto. Esta cirurgia foi cansativa, vou me lavar e atender o próximo.

Nossa, estou tonta, vou ficar mais um pouquinho na cadeira, acho que é normal, Dr. Bruno disse que é normal, muito tempo deitada na mesma posição. Ele deve ter pensado, que menina corajosa, ele é tão gentil, mas eu vi uma aliança na mão direita, ou será esquerda? Não importa, é comprometido de qualquer jeito, mas não custa nada admirar. Daqui a uma semana eu volto para tirar os pontos, outro sofrimento, será que dói? Até mais Verônica, sua fisionomia caricatural sempre estará marcada na minha lembrança.
[Texto baseado na aula de fluxo de consciência, de jornalismo literário]

3 comentários:

Anônimo disse...

Humm!! Que sofrimento hein?! Não gosto nem de imaginar...

Bjaoo Milla

Ah!! Não sei porque só consigo postar como anônimo :(

Gisa

André Martins e Ariele Andrade disse...

gostei... bastante fluxo de consciência, mas achei q faltou um pouco de descrição do ambiente. como era o consultório? faltou ambientar o leitor no consultorio para que ele assim vivenciasse o FC do personagem.

Unknown disse...

Milona sua louca.....adorei!!! Ate eu quero uma cosulta com esse seu dentista.....hauhauhau

Ficou massa mesmo!!!
bjao, Sarinha